No Bar da Esquina
Em uma tarde glamurosa de sábado com moças desfilando graciosas pelas calçadas-passarelas, o sol cobria tudo com sua manta dourada e os cachorros levavam suas senhoras viúvas a passear pelas ruas. Sento em uma mesa de bar numa esquina qualquer para ver as meninas passar nestes jardins de asfalto e concreto.
À minha frente, um cachorro fazendo companhia para uma velha senhora de cabelos tingidos. Ambos não trazem na face alegria e leveza dos que vivem, esperam com desestimulada resignação o dia de tudo isso acabar, não querem retornar à casa vazia, compulsivamente arrumada, mas sem brilho e um pouco de vento solar. Perderam a fé no telefone que não toca nunca e já criou visgo de tanto repousar na base. - Garçom, mas uma água com gás!
Desvio a atenção daquele par opaco, cúmplices de tanta solidão infinda e me atenho ao casal da mesa ao lado. Estão tão confortáveis consigo que não se incomodam com as longas pausas de silêncio. Olham numa mesma direção aparentando ter a certeza de todo seu futuro. Descobriram na simplicidade cotidiana o arroubo de um amor fruto da paixão febril. Fizeram um pacto de viverem juntos pelos próximos sessenta anos, pois só assim poderão ter certeza se é isso mesmo que querem para si.
Procuro em meus bolsos a carteira de cigarros mesmo sabendo que não fumo, hesito em pedir uma ao garçom, achei que o momento comportaria essa extravagância, mas logo percebo que as moças da mesa na diagonal desperdiçaram um breve olhar para mim. Passo a observá-las com mais atenção e sou interrompido pelo garçom que me traz outra cerveja.
Na mesa logo adiante um sujeito de estilo pós-hyppie finge ler as notícias do New York Times em seu laptop conectado a internet por seu celular. Precisa mostrar ao mundo que é um cidadão cosmopolita antenado e cheio dos gadjets inúteis. Não carrega nas mãos as marcas de um amor em sua vida.
Olho novamente para as moças que não mais me observam e acompanham pela tv o clip de uma canção que agora toca no rádio. Comentam sobre a roupa da cantora tentando adivinhar a marca e lembram de uma peça parecida que compraram da última vez que foram a Nova York.
De traje esportivo e tênis passa apressada a balzaquiana com seu jovem namorado. Caminha mais adiante satisfeita puxando-o pela mão. Acredita estar vivendo um instante perfeito.
Peço a conta e pego minha bicicleta. Já na rua, tento descobrir qual a melhor marcha para subir a ladeira e chegar em casa a tempo de assistir da minha janela ao espetacular pôr-do-sol que só essa cidade tem, com suas milhares de cores em tons lilás.
Inventado por: Henrique Neto às 19:31 | Link |
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