Página inicialPágina inicialPágina inicial

Click e veja a previsão do tempo em São Paulo-SP
São Paulo - Brasil






















Ei, assine meu livro de visitas!


 

Terra Santa
Blog do Mirandsa Sá
flickr
Orkut






# 2006!
+ dez
+ nov
+ out
+ set
+ ago
+ jul
+ JUN
+ mai
+ Abr
+ mAr
+ FEV
+ jan

# 2005!
+ deZ
+ nOv
+ ouT
+ seT
+ ago
+ JUl
+ JuN
+ mai
+ aBR
+ MAR
+ fev
+ JAn

# 2004
+ dEZ
+ nOv
+ OuT
+ seT.
+ AgO.
+ JuL.
+ JuN.
+ MaI.
+ AbR.
+ MaR.
+ FeV.

# 2003
+ DeZ.
+ NoV.
+ OuT.
+ SeT.
+ AgO.
+ JuL.
+ JuN.
+ MaI.
+ AbR.
+ MaR.
+ FeV.
+ JaN.

# 2002
+ DeZ.
+ NoV.
+ OuT.
+ SeT.
+ AgO.
+ JuL.
# Fase Racional







20040930



Caminho


Num setembro antigo reuniu os filhos para fazer uma faxina pesada na casa. Ia receber "a filha que vivia pra São Paulo", queria ter a casa asseada para quando chegasse. Clara cometia pequenos gestos.

No dia marcado, móveis no quintal e na calçada, água no chão, sabão com fartura, disposição para vassouradas, almoço atrapalhado e os homens para espanar o telhado até a cumeeira. À tarde óleo de peroba, álcool nos vidros e os colchões no sol para perderem o cheiro de mofo.

Dia da viagem, bagagem no porta-malas, meninos no banco de trás, atitudes não cotidianas. Clara pintou as unhas, arrumou o cabelo, calçou a melhor sandália, trancelim de ouro, tudo como não costumava fazer.

Como qualquer pessoa que não lê o futuro nem prevê a própria morte, agiu normal. Café, filhos, leveza, sandália nova, carro e... Minutos antes, Clara, ainda com calor, se perguntava se o caminho a ser percorrido era muito longo.



Inventado por: Henrique Neto às 23:01 | Link |

20040927



Universo


Um dia de calor úmido e a cidade torna-se praticamente inabitável. Burocratas saem desesperados dos escritórios à procura da cerveja mais próxima, crianças se apressam em deixar a escola, velhos vão aos pronto-socorros em busca de sobrevida, o trânsito buzina mais alto e, meu amor espera em casa enquanto prepara a jantar. Ouve o rádio, cantorala um samba do Chico e pensa em quantos filhos me daria se possível fosse.

Uma mulher estéril tem frustração para encher o Maracanã. Não adianta usar argumentos prontos na tentativa de desviar a atenção do fato. Adoções altruístas, generosidade admirável e outras conversas paliativas, nada aplaca a tristeza da mulher estéril. Só elas são nostálgicas de si e Patrícia representava bem esse papel.

Na descoberta, quis morrer, me deixar, acabar o casamento e mudar para a Finlândia (tudo exatamente nessa ordem). Num segundo momento ria de sua tolice pueril e me fez jurar que a deixaria se bem quisesse. Mas Patrícia não entende que as coisas não são assim tão cartesianas quanto ela imagina. Entre a impossibilidade da prole, o conforto do não contraceptivo e a tranqüilidade de estarmos em casa ou com o pé no mundo sem nos preocupar com o porvir, ela chora pensando nos enxovais e chás de bebês que jamais fará.

Patrícia não trabalha, decidiu-se pelo capricho do lar, os cuidados comigo e a pré-disposição em satisfazer minhas vontades. Eu sou sua religião, seus ideais, sua maneira de ver e entender o mundo. Sem mim patrícia apenas está, nunca é.

O calor desse verão fora de época me deixa em bicas. Chego em casa com um vinho rotineiro, deixo o paletó sobre a cadeira, agarro o corpo falso-magro de patrícia por trás, beijo-lhe a nuca e penso que nada me falta, exceto Patrícia. Ela me morde o pescoço, se esfrega maliciosa, aperta os seus seios contra mim e me diz sem desmanchar o sorriso que comprou ótimos tomates em promoção para o molho do jantar.

Minha pele tem a memória do corpo de Patrícia e é com ela que sonho todas as noites depois do sexo apetitoso em que me alimento.

De noite, na hora de dormir, Patrícia se aninha entre minhas coxas e me faz lembrar que a rotina, o calor, o supermercado, os tomates e tudo que dela advém, faz parte de um universo cotidiano só nosso.


Inventado por: Henrique Neto às 20:33 | Link |

20040926




+++


– o problema é que você usa o celular pendurado na cintura, e isso fica pernóstico.


+++


As palavras nunca darão conta de dizer tudo!


+++


O desconforto maior é essa vontade de querer estar onde não se pode.



Inventado por: Henrique Neto às 23:41 | Link |





Morro do Careca, praia de Ponta Negra - Natal/RN. / fonte: www.fotolog.net/dulldu




Inventado por: Henrique Neto às 21:27 | Link |

20040921



A bombonière cafona


De quatro, enquanto ainda atendia ao último cliente do dia, Natasha olha a louça suja em cima da pia do pequeno conjugado onde vive. Sabia que tinha se esquecido de alguma coisa, não comprou desinfetante de pia.

Mais uns minutos e seu cliente deitará arfante e imundamente suado ao seu lado. Chorará. Dirá que não deveria ter feito aquilo, pois é casado e ama sua esposa. Que é um cachorro e etc. etc. etc.

Natasha desde pequena via o mundo de uma maneira muito particular. Ao contrário dos meninos de sua idade – uns trogloditas! – , era todo educadozinho, falava baixo e preferia brincar de casinha com as meninas. Uma moça, por assim dizer.

Hoje, do alto dos seus trinta e seis anos inconfessáveis, Natasha vive num conjugado minúsculo na avenida São João e sonha pelas frias madrugadas em poder voltar para casa mais cedo e dormir. São anos indo pro ponto batalhar uma grana de terça a domingo.

Natasha tem os braços queimados dos cigarros dos clientes. Tem uma tosse seca que nunca sara; uma caderneta de poupança que não chega a cinco mil; os dentes brancos a custa de constantes visitas ao dentista; cabelos compridos artificiais; joanetes e a certeza de que vai contrair o vírus a qualquer momento.

Natasha antes não beijava na boca, hoje isso não passa de uma questão de cédulas. Pagando bem acredita até nas histórias dos homens casados que todas as noites lhe procura se dizendo "héteros convictos".

Natasha perdeu a paciência, os sonhos e um anel cravado de pedras semipreciosas. Agora quer juntar uma grana para comprar uma casa no interior do Espírito Santo e ter uma vida digna de bicha velha. Natasha também quer ser mãe e vai adotar uma criança (nem se dá conta desses sonhos clichês que só os veados têm).

Terminou semana passada um namoro de três anos com um garotão do interior. Antes de ir embora ele lhe deu uma surra de cinta que arrancou pedaços, e levou embora uns dólares que achou dentro de uma bombonière cafona que ela guardava em cima de um móvel na sala.

Pensou em fazer um boletim de ocorrência, mas estava cansada demais para ir até à delegacia. Natasha odeia ter de sair de casa.

Se esqueceu de comprar o desinfetante de pia. Lembrou disso enquanto ainda estava de quatro atendendo ao último cliente do dia, e olhava a louça suja em cima da pia do pequeno conjugado onde vive.

Por estes dias, deu para achar que sua vida estava monótona demais.



Inventado por: Henrique Neto às 23:38 | Link |

20040920



O amor e outros objetos pontiagudos


"Ele tem outra!".

Concluiu com a certeza que só as mulheres apaixonadas têm. São evidências demais para nós, os homens, que de tão óbvias não enxergamos. Tudo esfria quando há outra mulher na relação. São beijos displicentes, noite de amores não tão plenos e cheiros alheios a doce rotina.

Pedro tinha uma namorada no escritório. Amava o filho pequeno, respeitava demais a mulher, mas como todo homem casado tinha uma amante. "Uma canalhice desnecessária!".

Camilla amava Pedro desde quando era nova. Sabia que ele o amor da sua vida para todo o sempre. Somente quando temos dezoito anos essas certezas são assim, definitivas.

Thays também estava apaixonada por Pedro. Era uma morena bonita, dessas que estão na moda hoje em dia. A ansiedade a agitava por estar de novo com alguém com filho e um casamento no currículo, além do desassossego de ser a outra. Tentava achar que eram só 'pequenos detalhes', iria se acostumar com essa idéia. Ela estava vivendo essa paixão e ia largar de vez a namorada.

Camilla decidiu – enquanto lavava a louça – que ia contar tudo para o marido. Pedro devia saber que ela também estava apaixonada, e assim como ele, tinha outro alguém que a fazia feliz. Ia dizer a Pedro do seu romance com Thays. Uma moça morena e bonita que estava acabando um relacionamento conturbado com um cara do escritório em que trabalhava. Ele era casado e pai de um filho pequeno.



Inventado por: Henrique Neto às 01:58 | Link |

20040916



O avião e outros objetos que caem

Sentado na privada de sua casa, superman pensa nos seus dias de glória. Lembra de quando ainda morava no Andaraí, das conversas na praça e das moças do lugar sempre de olho. Está desocupado por esses dias, tirou férias da Liga.

Hoje passa as tardes respondendo palavras-cruzadas, espremendo cravos e negociando a paz com a solidão (ele agora está pensando em vender o fusca). Se acha habilidoso, de certa forma. Consegue pôr a linha na agulha com rapidez, faz pequenos reparos na casa, queima incensos, mas ainda não perdeu seu medo de baratas.

'Felizes são os velhinhos que dançam em traje de gala!' – pegou-se imaginando. Lá pelas quatro, enquanto preparava o café do abandono, superman lembrou da priminha que comeu em cima do baú grande de madeira. As crianças e sua deliciosa falta de caráter...

Sente melhora do reumatismo, alugou uma casa na Pipa e pensa em voltar a praticar boxe tailandês. Atividades de passa-tempo. No fundo, superman sabe que é bem triste e nas madrugadas, acorda suado com o sonho repetido do avião que cai.






Inventado por: Henrique Neto às 23:10 | Link |

20040914



Tânia, uma moça elegante, fez um blog idem – o terra santa –.

Visitem e comprovem como o bom gosto e as raízes podem andar de mãos dadas.

Lá ela desnuda nossa querida Espírito Santo, terra onde esse humilde digitador nordestino nasceu, lá no coração do agreste potiguar.

Só não vá se esquecer de incluir nos seus preferidos. Por favor, heim gente. Por favor!



Inventado por: Henrique Neto às 22:50 | Link |

20040913



Os gordos não mentem


Luciana, moça de seus trinta e inconfessáveis anos, estava casada fazia outros tantos. Tinha descoberto em um teste de revista feminina que vivia uma relação estável e feliz com o seu Antonio. Moravam numa casa com jardim na frente e bica no quintal lá no Alecrim (herança do sogro). Vendia produtos da Natura para as amigas e tinha o poder de juntar gente onde quer que estivesse.

Antonio achava bonito esse jeito conversador de 'Ciana', se incomodava apenas com as visitas de Graça, uma gorda infame da vizinhança. Era todo dia e toda hora Graça na sua casa, não se mancava a mulher. Passava os dias a contar histórias dos vizinhos para Luciana enquanto fazia sua unha do pé sem pressa.

Um dia de calor, desses que deixa qualquer um desanimado, Luciana foi à cidade comprar uns produtos de beleza que estavam em falta nas suas vendas de porta em porta. Ao chegar em casa encontrou Antonio sentado na cadeira de balanço da área grave e denso. Nada quis dizer. Martelava na cabeça a imagem de Graça, a gorda incômoda, lhe ameaçando de dedo em riste: "tu vai comigo amanhã à tarde, ou conto para a Luciana da tua namorada de Emaús".


A namorada de Emaús

Silvana tinha dezenove anos recém completos. Morava com os pais numa casa assobradada em Emaús e aos sábados ia passear com Antonio em Ponta Negra. Silvana tinha ganho as alianças fazia uma semana e já estava aprontando o enxoval. Silvana estava apaixonada por Antonio. O pai dela tinha aprovado o namoro mesmo sabendo que o rapaz era mais velho. A mãe tinha gosto de ver a filha feliz com um moço tão bem apanhado.


A má sorte de Antonio

Graça, numa abstinência, depois de ter chorado horas pela quebra de mais uma dieta baseada em chuchu e pepino, resolveu ir para uma roda de samba com suas amigas. Todas gordas e também infames. Emaús é um bairro novo na divisa de Parnamirim com Natal.

Numa dessas convergências improváveis, Graça entra esbaforida no Select do posto em que Antonio divide um mesmo cachorro-quente com sua namoradinha, Silvana.

Graça parou, olhou e mostrou a Antonio que tinha visto ele, a namorada, o cachorro-quente e entendido todo o ar juvenil que só os namorados têm.

Antonio viu graça, viu que ela viu Silvana, o cachorro-quente e notado o ar juvenil estampado na sua cara.

Antonio sentiu gravidade na ameaça de Graça. Percebeu que ela dizia a verdade quando jurava contar tudo a Luciana. Sabia que ela acreditaria na gorda infame. Tinha como líquido e certo o fim dessa novela paraguas. Ia perder sua 'Ciana', a mulher que um dia lhe confessou distraída enquanto cortava cebola: "só os gordos não mentem".



Inventado por: Henrique Neto às 23:13 | Link |

20040907













Inventado por: Henrique Neto às 19:28 | Link |



La passion


Sentada na beira da cama de casal, Sandra chora. Lembra do amor que teve, da juventude nem tão distante, dos momentos em que fora mulher, viagens de fim-de-semana, filhos criados e nesses dias, a solidão. Amava àquele homem com sofreguidão. Amava à distância, através das roupas sujas que lavava, da cama desfeita, da silhueta do corpo pela porta entreaberta, pelo filho agora homem. Amava, ainda que sozinha. Sabia que podia conseguir outros amores de passa-tempo, mas não queria nem podia.

Vivia a margem depois da separação. Andava por trás da rua, sorria a procura dele e nas festas em família onde ainda era considerada qual e tal, cantava espumas ao vento e ficava de olhos rasos. O amor tem desses clichês necessários.

Olhava a casa, planejada e construída em parcelas, a piscina, os meninos lindos e cheios de vida para viver e pensava, secretamente, que tudo voltaria a ser como antes – com fé em nossa senhora da piedade!

Numa noite, dessas bem normais, de cadeira na calçada e conversa frouxa, viu subindo a rua a mulher em quem pensara em todos os dias com ódio sincero. A destruidora do seu casamento, do seu riso. Deus sabe como as pessoas se transformam em nome de suas paixões...

Correu descalça em direção a vadia e com obstinação, deu-lhe na cara generosas tamancadas.

O povo aplaudia realizado enquanto Sandra chorava um choro nem alegre nem triste, mas redentor.




Inventado por: Henrique Neto às 19:10 | Link |

20040905



Penélope

A navalha corta meu cabelo. Me concentro na dor. Penso nela como uma rara possibilidade de ter estimulado pontos nervosos em minha cabeça que de outra maneira seria improvável. Jatos de energia descem em impulsos elétricos que se enraizam corpo abaixo. A dor quase se extingue, passa a ser apenas um gosto seco e cheio de ânsia, como quando estamos diante daquele segundo que precede o estouro de uma bombinha de são joão. Minha mente está em ALT numa transição indefinida.

Sentado na cadeira da barbearia, penso em Penélope enquanto vigio a navalha e me asseguro que o barbeiro com parkinson não vai me deixar a cara em postas. Não sou mais dono do meu corpo, ele agora é um ser autômato que pensa e tem gostos próprios. Ele me lembra Penélope e logo prepara uma ereção constrangedora. Da última vez estava de pé em frente da minha chefe, que sentada poderia –e deve– ter visto meu estado de priaprismo inoportuno.

Penélope virou uma entidade, uma agência reguladora do meu ser. Quando sai de casa, meu corpo bebe, vomita, e cambaleia chapinhando na poça do lado da privada. Na fila do ônibus, tomando um café na padaria, na reunião de trabalho, é Penélope quem vejo me cavalgando louca. Suada, com os cabelos maravilhosamente desgrenhados, Penélope me chupa e me agradece.

Quando vem à minha casa e me queima distraída fumando seu beque, quando usa minhas cuecas samba-canção para dormir ou simplesmente na sua ausência, Penélope são todas as mulheres que desfilam no meu campo de visão. Penélopes de todas as cores e lordoses.

Dia desses, no auge de um ato pleno de sodomia, Penélope cravou suas unhas em minhas costelas arrancando uma lasca de pele e carne e sangue. Perdi minhas referências de dor e agonia. Troquei todos esses substantivos por um só, Penélope.



Inventado por: Henrique Neto às 13:01 | Link |

20040904



Caixa de correio

amigos,

preciso compartilhar isso com vocês:

"BBC Brasil - Há mais alguma coisa no mercado literário que vem chamando sua atenção atualmente?

Chico Buarque - Li um romance do Pirandello, a quem só conhecia como autor de teatro. Tenho lido bastante, existe um autor novo que gosto muito, o João Paulo Cuenca."

abs

jp*


* * *
Meu camarada João Paulo Cuenca me mandou esse eMail aí em cima. O cara está ficando cotado.



Inventado por: Henrique Neto às 21:33 | Link |

20040902



Receita

Fazer um texto não é difícil. Como tudo na vida, basta que sigamos um método. Depois de muitos estudos sobre o assunto, tendo consultado desde os mais ancestrais pergaminhos ciganos da Checoslováquia até as últimas pesquisas científicas norte-americanas, juntei conhecimento suficiente para produzir um pequeno tratado sobre o tema. Se o publico aqui não é por vaidade ou capricho, mas porque acho que todo conhecimento deve ser compartido. Dessa forma, tenho esperança, chegará o dia em que todo o saber humano poderá ser reunido e centralizado em um único programa de computador, ou software — que é o termo correto — e vendido a preços módicos nas bancas de jornal, postos de gasolina ou virão grátis nas compras acima de 50 reais nos supermercados Mambo(*). Aí vai, portanto, a minha modesta contribuição.

Como escrever um texto

Assim como para fazer uma sopa é preciso, antes de mais nada, escolher os ingredientes, para escrever um texto é necessário, primeiramente, selecionar as palavras que vamos usar. Se para os ingredientes da sopa vamos ao mercado, para encontrarmos as palavras recorremos ao dicionário.

Algumas considerações desnecessárias (porém interessantes)

O dicionário é superior ao mercado em muitos aspectos. Em primeiro lugar, porque no dicionário o preço das palavras não cresce a cada dia — como ocorre com os legumes no mercado —, posto que todas são de graça. Ademais, os dicionários podem ser guardados na estante da sala, o que seria impossível de se fazer com um mercado — não por sua forma, muitas vezes retangular como os dicionários, mas devido ao tamanho (mais provável seria guardar a estante da sala no mercado, mas isso seria inútil tendo em vista que nosso objetivo não é dar cabo da estante e sim escrever um texto). Há uma diferença básica entre os mercados e os dicionários: se nos primeiros os produtos entram novos e saem assim que fiquem velhos, no segundo não se encontra um só artigo novo, pois ser velho é condição sine qua non para estarem ali. Apesar das considerações anteriores, é impossível provar logicamente a superioridade de um mercado sobre um dicionário ou vice-versa. Prova disso é que podemos tanto encontrar dicionário em um bom mercado, como mercado em um bom dicionário. Assim sendo, deixemos de lado essas comparações inúteis e voltemos ao tema em questão: como escrever um texto.

Agora sim, como escrever um texto, parte I: Ritmo

Tanto os pergaminhos ciganos da Checoslováquia como os cientistas norte-americanos estão de acordo em um ponto: um texto deve ter ritmo. Por isso, uma vez aberto o mercado, perdão, o dicionário, é importante ter em mente que um bom escrito leva um número equivalente de palavras pequenas, médias e grandes. Um método infalível na hora de separar as palavras é, sempre que escolhermos uma curta, como chá, lua ou oi, buscarmos imediatamente uma comprida, como halterofilismo, mononucleose ou antropomorficamente.

Assim que você sentir que já tem em mãos um bom número de palavras curtas e longas — isso depende do tamanho do texto que quiser escrever —, parta para a busca de um número igual de palavras médias, tais como sudorese, abobado ou alicate. Aconselha-se anotar essas palavras num papel, com lápis ou caneta, ou datilografá-las num computador ou máquina de escrever, de acordo com as condições infra-estruturais de cada um. (O texto final, no entanto, poderá ser escrito de muitas outras maneiras, como com sangue nas paredes, com canivete num tronco de árvore ou com um arco de violoncelo nas areias de Jericoacoara, dependendo não só das condições infra-estruturais como do efeito desejado. Isso fica a cargo do autor.)

Parte II: Etiqueta ou bom senso

Se para uma sopa de batatas precisamos de muitas batatas e para uma sopa de beterraba muitas beterrabas, para um texto triste precisamos de palavras tristes, para um texto audacioso de palavras audaciosas e para um texto semi-erótico de palavras semi-eróticas. Se o autor tem em vista um texto fúnebre, por exemplo, não cairão bem as palavras lantejoula ou meretrizes, assim como num convite de casamento dificilmente se poderá usar a palavra excremento (apesar de, todo o apelo que a rima possa ter). É sempre bom observar essa pequena, porém importante, formalidade da escrita.

Parte III: Pontuação

Nesta altura o futuro autor já tem consigo um bom número de palavras, harmoniosamente divididas entre curtas, médias e longas, anotadas em alguma superfície de celulose ou cristal líquido. Chegou a hora de condimentar essas palavras. Os pontos são no texto o que os temperos são para a sopa, e é importante saber usá-los. Para cada cinco palavras, em média, o autor deverá ter uma vírgula. Para cada dez, um ponto. Para cada 15, uma interrogação e/ou uma exclamação.

Algumas dicas: para um texto mais picante, acrescente muitas exclamações. Nunca use muitas interrogações se o texto se destina a um grande público. Por último, evite as crases, os tremas e o ponto-e-vírgula, pois são de sabor muito forte e devem ser usados com parcimônia, assim como o gengibre ou o curry na culinária.

Parte IV: Prosa e poesia

Tendo os ingredientes e os temperos todos à frente , é chegado um momento muito importante, a hora de se decidir que tipo de texto se quer escrever. Há somente dois, prosa e poesia. É muito fácil diferenciar um do outro: os de poesia são fininhos e as frases se colocam umas sob as outras, formando pequenos blocos. Ao final de cada um desses tijolinhos, pula-se uma linha e começa-se um novo. Os textos de prosa são mais consistentes, e as linhas ocupam toda a extensão da página, desde a margem esquerda até a direita. Se o autor é preguiçoso ou está terrivelmente atrasado para algum compromisso, convém fazer uma poesia. Nesse caso, vale a pena seguir alguns passos.

1 — Volte ao dicionário e busque algumas interjeições como Oh! e Ah!. Não economize também nas reticências, exclamações e interrogações. São pequenos detalhes, mas muito úteis. Mesmo a mais simples das frases, se antecipada por uma dessas palavrinhas e seguida por esses pontos, ganhará um novo alento, uma vaguidão que facilmente será confundida com profundidade, como você pode comprovar no exemplo a seguir:

Antes:
Havia casas azuis.
Depois:
Oh! Havia casas... Azuis?!

Caso o futuro autor disponha de mais tempo e motivação, e deseje escrever um texto em prosa, não encontrará grandes dificuldades. Basta pegar todas as palavras previamente selecionadas e dispô-las sobre a página. Não é preciso lavá-las nem deixá-las de molho. Tente sempre mesclar as pequenas, médias e grandes. Lembre-se de que os pontos, as exclamações e interrogações vão sempre ao final das frases, e os acentos em cima das palavras. A cada seis ou sete linhas, termine uma frase no meio da folha e comece outra embaixo, depois de um espaço. Isso se chama parágrafo.

Os antigos pergaminhos da Checoslováquia demonstram alguma preocupação quanto à importância do sentido e da clareza em um texto. As últimas pesquisas norte-americanas, no entanto, provam que essas questões são absolutamente irrelevantes. Uma rápida visita a uma biblioteca demonstrará que há textos dos mais absurdos impressos por aí, e que nem a clareza nem o sentido são as características que fazem deles clássicos ou novelinhas baratas, exemplares da Academia Brasileira de Letras ou calço para mesas.

Por último, cabe destacar que um texto, ao contrário de uma sopa, não alimenta, não esquenta, nem pode ser servido com conchas. Assim como até hoje não tive notícias de nenhuma ONG ou instituição beneficente que saia pelas madrugadas frias distribuindo textos e cobertores para mendigos (embora não seja uma má idéia). Não podemos deixar de mencionar que um texto resulta mais prático que uma sopa, pois pode ser guardado na estante da sala e não precisa ser resfriado nem muito menos congelado.

Apesar das considerações anteriores, é impossível provar a superioridade de um texto sobre uma sopa ou vice-versa. Mesmo porque, é possível encontrar tanto letras em boas sopas, quanto sopas nas boas letras. Assim sendo, vamos ficando por aqui. Afinal, os textos e as sopas, os mercados e os dicionários, as palavras grandes, os ingredientes, eu, você, os cientistas norte-americanos e os pergaminhos da Checoslováquia nos assemelhamos numa única coisa: todos, em algum momento, chegamos ao fim.

(*) Promoção válida apenas para as lojas Mambo em São Paulo (capital), Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Macapá, Acre e Roraima: que se danem!

Trecho de "As Pernas de Tia Corália", livro de Antonio Prata.



Inventado por: Henrique Neto às 23:17 | Link |

20040901



It’s being a hards days weekends


Fim-de-semana começando na madrugada de Sexta com vôo torto, atraso na saída, frio e chuva no Rio. De dia foi cristo sem cartão postal nem vista da cidade maravilhosa, visita ao maracanã com direito a vestiário e gramado, litros de chopp no almoço, jardim botânico e risos frouxos à tarde. O telefoninho móvel enlouquecido cantando sem parar. À noite foi feira de são cristovão, cervejada, cachorra se exibindo pra câmera e forró na lama. No outro dia era sábado, tinha praia, calçadão, água de coco e titãs na areia de copa. Um convite para se tomar cachaça por metro, vinho vagaba e outras variações do álcool.

Porre não combina com avião nem horário de volta. Um vexame em plena madrugada carioca. Mas nada como chegar em caso com dia de sol garboso, churrasco na casa de amigos, mais porre e uma laje preguiçosa. Vergonha mesmo foi vomitar as paredes do banheiro alheio, ser tirado de cena para um banho emergencial e acordar segunda trajando roupas e um colchão que não lhe pertencem. E numa pausa entre uma confusão e outra, blog!

Inventado por: Henrique Neto às 13:15 | Link |





































blogchalk: Henrique /Male/26-30. Lives in Brazil/Sao Paulo and speaks Portuguese. Spends 70% of daytime online. Uses a Fast (128k-512k) connection.


































































Tá procurando o quê aqui embaixo???
Rá lá pra cima