Dançar com você e depois morrer de traição
Ainda rindo, se segurou para não cair. Virou para ver quem era mas não conseguiu. Tomou um abraço rápido e forte que prendeu seu braço direito em gancho. Aquele desconhecido rapaz arfante agora respirava colado ao seu rosto. Tentou se soltar mas não teve forças. A vista desfocada, e os gritos, e o escuro, e de repente o silêncio. Frio.
A última imagem que viu foi de uma peixeira vindo em direção a sua barriga num movimento em arco. Preciso. Tumulto à sua volta. Gritos de clamor. Todos lhe olhando apavorados. Frio. Silêncio. A vista turvando. Frio. Solidão. O teto branco da ambulância. Frio. O sorriso nos seus lábios. Frio. Silêncio.
Seus irmãos gritavam. Ele não ouvia mais nada, ria apenas. Frio.
Dezesseis anos antes
Cristiano era o filho do meio. Nasceu num sítio em Lagoa do Poço. Adorava andar em cavalo brabo e sem cela, brincar no terreiro com seus irmãos, tirar leite das vacas com o pai, e de todas essas coisas normais que gente normal gosta e que ficam absurdamente sem graça quando contadas.
Usava cabelo grande, uma promessa que sua mãe fez a Nossa Senhora da Piedade na hora do parto para que os dois não morressem, ia cortar só quando fizesse dezoito.
Era o mais comportado dos três irmãos, tirava as melhores notas na escola e nunca deu desgosto em casa. Suas professoras se derretiam em elogios para os seus pais. As meninas chamavam ele de anjo e as mais empolgadas promoviam calorosas discussões sobre a cor dos seus olhos, que até mesmo a mãe vacilava em dizer se eram verdes ou azuis.
Nessa mesma época seu pai lhe deu um cavalo branco. Recebia mesada de cinquenta reais e esse dinheiro rendia, para alegria dos irmãos. Aos dezesseis, homem feito, o pai incentivava para que saísse com os irmãos. Emprestava a chave da caminhonete para o mais velho e pedia que chamasse Cristiano para as festas. Levou um tempo até que aceitasse um desses convites.
O dia da festa
Era três de abril, uma semana antes de seu aniversário, Cristiano decidiu acompanhar os irmãos na festa da padroeira em Goianinha. Fazia muito calor naquela sexta-feira.
A mãe, sentada num canto da sala tecendo bordado, acompanhava a agitação dos meninos enquanto se arrumavam. Vieram todos beijá-la na testa antes de sair como faziam desde pequenos. Ela arrumou a barra da calça de Cristiano e pediu pro mais velho não correr --a estrada vivia cheia de buracos.
O pai deu dinheiro aos três e lembrou a eles que voltassem logo, iam à feira de Santo Antônio de manhãzinha.
À noite, na festa
Uma bela moça, já quase entediada, disse não para um rapaz mal encarado que veio tirar ela para dançar.
Quinze minutos depois, observando bela moça de longe, Cristiano se encheu de coragem e foi até lá chamar ela para dançar.
Felicidade
Bela moça aceitou na hora. Perguntava de onde ele era, nunca tinha visto tal rapaz. Ele ria e contava que era dali de perto mesmo, foi quando sentiu alguém lhe puxar pelo ombro.
Traição
Ainda rindo, se segurou para não cair. Virou para ver quem era mas não conseguiu. Tomou um abraço rápido e forte que prendeu seu braço direito em gancho. Aquele desconhecido rapaz arfante agora respirava colado ao seu rosto. Tentou se soltar mas não teve forças. A vista desfocada, e os gritos, e o escuro, e de repente o silêncio. Frio.
Inventado por: Henrique Neto às 19:53 | Link |
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