O botão da camisa
De pé lavando a louça do café, Marina chorava lágrimas de revolta. Ele tinha outra.
Sabia disso desde o dia em que ele voltou para casa com um botão da camisa pregado com uma linha que não era de sua caixa de costura. Ela, a mulher com quem ele saía nas noites mal explicadas quando chegava tarde em casa, mandou esse recado nada sutil. Só uma mulher sabe como atingir outra sem maiores delongas.
Marina vivia a felicidade do lar em seu casamento. Descobriu isso respondendo a um teste numa revista feminina. Fez 39 dos 40 pontos. Discordava de uma questão que dizia: “você é o tipo da mulher que incomoda seu esposo com assuntos menores como o preço do repolho, a nova marca de panelas com teflon, como deve se tratar a diarista?”. Achava que deveria, sim, participar ele de tudo, isso demonstrava sua devoção e respeito à figura do homem da casa. Respondeu sim e perdeu pontos.
Fora esse detalhe adjacente, tudo transcorria bem, ou quase, até a noite anterior, quando ela descobriu o famigerado botão. Ela - a outra - queria denunciar o romance vivido com seu marido. Conseguiu. Passou a vasculhar mais evidências em suas roupas, no seu celular, nos lenços e, como havia perdido por completo a noção do limite, resolveu contratar um detetive particular.
O araponga, acostumado a veleidades femininas, não estranhou quando ela pôs a tal camisa sobre sua mesa. Ela queria tudo, fotos, datas, nomes e se possível, gravações da conversas dos dois. Alterou sua rotina. Ia quase todos os dias em busca de novidades no escritório escuso no centro da cidade, e quando não as conseguia, passava na cartomante.
Numa tarde, ao cabo de três meses, após ficar sabendo por Sá Maroca que ele voltaria para casa e deixaria para sempre a amante, voltou radiante para casa. Pensou em preparar um caldinho verde todo especial (como ele adorava), comprou gérberas para enfeitar a sala, ia até botar vestido novo naquela noite.
Deixou as compras sobre a mesa quando viu as portas do armário abertas. Correu pro quarto. Em cima da cama, junto com o cartão do banco, um bilhete mínimo dizia:
“Deixei um dinheiro depositado para você. Fui viajar. Pague a prestação da geladeira. Assim que arrumar um advogado, ele vai te procurar". Pedro.
Inventado por: Henrique Neto às 00:45 | Link |
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