Estudando a Palavra
Era só a intenção de escrever um texto que fugisse do famigerado tripé amor/flor/dor. Os modernos chamarão a isso de ensaio. Já eu, mais modesto, digo que é só uma tentativa. Oficina da palavra. Oficina da escrita em meio aos compromissos que pagam o aluguel e a fatura do cartão de crédito. Um hiato - praticamente.
Era para dizer de subtextos, de atos que transcendem qualquer palavra e outros pontos mais sutis do cotidiano que me escapam (sempre penso em escrever sobre essas sutilezas, mas elas são mais leves do que imagino). Não sou um bom caçador da matéria pouco densa, mas a observo de longe, ainda assim. Estudo maneiras de como dar um bote certeiro.
Uma ligação que deixou de ser feita pode dizer mais que as consumadas, um vacilo na sua voz, o silêncio entre frases, seu jeito polido, um sorriso ensaiado, tudo parece verter palavras. É a essa leitura que tenho dedicado meus dias. Cavucar o menos óbvio, observar a moça de olhar lascivo que passa discreta por trás do tumulto, entender a postura dos que queriam outra coisa, outra pegada da vida.
Borboletas que se debatem no ar colorindo o cotidiano, mandando mensagens elaboradas à nossa percepção pobre, como decifrar tão nobres signos? Por onde andará o bloco de notas? Por onde começar essas notas mínimas?
A dúvida freia, a memória apaga, mas a sensação de dejavù já é.
Um filtro polarizador instalou-se em minha retina – acredito eu –, ele separa em gamas de cores as imagens, faz a passagem de luz ser mais fluída que o esperado, congela o instante entre atos, reverbera o som de murmúrios, captura momentos de abstrações e diz dos outros o que até então era guardado em segredo de família.
É história mais elaborada que música de Baden Powel. Sua audição é tão prazerosa que uma vez exposto, você estará profundamente marcado. Tal como amor amancebado.
Inventado por: Henrique Neto às 13:00 | Link |
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