A 'inteligentsia' convulsiva
- Você já leu Chomsky, né? - [...] - Não!? Como assim: 'nunca ouviu falar'? Noam Chomsky, o mais libertário pensador norte-americano!
O Pescoçudo faz ar de fatigado.
Repetia esse comentário pseudo-indignado, em cada roda de conversa. Fazia ar de cineasta em crise, se revoltava com o imperialismo yankee e outras mumunhas mais, só para ter mote e proferir seu único discurso estimação.
Desde que assistiu na tv educativa, um documentário falando sobre o intelectual americano hype, Noam Chomsky, vive repetindo expressões como: "as mais polemicas e lúcidas análises", "o papel contemporâneo da mídia na fabricação do consenso nas sociedades de massas" e "intelectual suspeito para a esquerda dogmática". Tinha pequenos tremores, só de ouvir o som de sua voz articulando tão sonoras frases.
Depois do famigerado documentário, passou a admirar ("- desde a adolescência", é bom que conste!) os pensadores judeus, como: Martin Buber, Gershom Scholem e todos os outros da tradição dos emigrantes anarco-sindicalistas. Aliás, "anarco-sindicalistas" era a palavra. Ele fazia tamanha milacria com o rosto e as mão antes de pronunciá-la, que a audiência temia que entrasse em processo convulsivo ou coisa parecida.
O Pescoçudo estava mesmo intragável. Sua chegada nos lugares era, invariavelmente, precedida de vácuos provocados pela platéia em fuga desesperada. Cada frase sua começava com uma citação, duas referências à "problemática da teoria da libertação", o último livro de João Gilberto Noll e uma piada intelectualizada de fazer tremer Ferreira Gullar. Os insistentes que ousavam permanecer na mesma roda, eram obrigados a ouvi-lo regurgitar os nomes dos livros que havia "devorado" nas últimas semanas, além de seu especial interesse pelo cinema de Tonga.
Sua última aquisição foi um guia para se tornar culto e elegante. Ficou estarrecido ao constatar que havia uma série de livros e filmes que ainda não tinha em sua coleção. Num surto consumista, comprou todos exemplares de uma tacada só.
Agora, entre a preocupação em decorar trechos inteiros da obra dos pensadores, e entender o os edifícios harmônicos dos compositores clássicos, pensa numa maneira de sair da pendura em que se enfiou com o cartão de crédito.
Ontem ainda, fez muxoxo com um colega que depois de lhe emprestar uns cheques, ousou admitir desconhecer Chomsky e sua obra.
ADVERTÊNCIA: O personagem aqui desnudo, é obra da cabeça doentia desse escriba. Qualquer semelhança com amigos ou conhecidos seus, é por sua total conta e risco.
Inventado por: Henrique Neto às 13:44 | Link |
|